quarta-feira, 17 de abril de 2019

A Lei e a Graça

(Comentário Êxodo 20: A LEI)

É da maior importância compreender o verdadeiro caráter e o objeto da lei moral, como nos é apresentada neste capítulo. Existe uma tendência no homem para confundir os princípios da lei com graça, de sorte que nem a lei nem a graça podem ser perfeitamente compreendidas, e assim a lei fica despojada da sua austera e inflexível majestade, e a graça fica privada de todos os seus atrativos divinos. As santas exigências de Deus ficam sem resposta, e as profundas e múltiplas necessidades do pecador permanecem insolúveis pelo sistema anômalo criado por aqueles que tentam confundir a lei com a graça. Com efeito, nunca podem confundir-se, visto que são tão distintas quanto o podem ser duas coisas. A lei mostra-nos o que o homem deveria ser; enquanto que a graça demonstra o que Deus é. Como poderão, pois, ser unidas num mesmo sistema? Como poderia o pecador ser salvo por meio de um sistema formado em parte pela lei e em parte pela graça? Impossível: ele tem de ser salvo por uma ou por outra.

A lei tem sido às vezes chamada "a expressão do pensamento de Deus". Mas esta definição é inteiramente inexata. Se a considerássemos como a expressão daquilo que o homem deveria ser, estaríamos mais perto da verdade. Se eu considerar os dez mandamentos como a expressão do pensamento de Deus, então, pergunto, não há nada mais no pensamento de Deus senão "farás" isto e "não farás" aquilo? Não há graça, nem misericórdia nem bondade? Deus não manifestará aquilo que é, nem revelará os segredos profundos desse amor que enche o Seu coração? Não existe nada mais no coração de Deus senão exigências e proibições severas? Se fosse assim, teríamos de dizer que "Deus é lei" em vez de dizermos que "Deus é amor". Porém, bendito seja o Seu nome, existe muito mais em Seu coração do que jamais poderão expressar os "dez mandamentos" pronunciados no monte fumegante. Se quero saber o que Deus é, devo olhar para Cristo; "porque nele habita corporalmente toda a plenitude da divindade" (Colossenses 2:9). "Porque a lei foi dada por Moisés; a graça e a verdade vieram por Jesus Cristo" (João 1:17). Certamente, na lei achava-se uma certa medida de verdade; continha a verdade quanto àquilo que o homem deveria ser. Como tudo que emana de Deus, a lei era perfeita — perfeita para alcançar o fim a que era destinada; porém esse fim não era, de modo nenhum, revelar, perante pecadores culpados, a natureza e o caráter de Deus. Não havia graça nem misericórdia. "Quebrantando alguém a lei de Moisés, morre sem misericórdia" (Hebreus 10:28). "O homem que fizer estas coisas viverá por elas" (Levítico 18:5; Romanos 10:5). "Maldito todo aquele que não permanecer em todas as coisas que estão escritas no livro da lei, para fazê-las" (Deuteronômio 27:26; Gálatas 3:10). Nada disto era graça. Com efeito, o monte Sinai não era o lugar para se procurar tal coisa. Jeová revelou-Se ali em majestade terrível, no meio da obscuridade, trevas, tempestade, trovões e relâmpagos. Estas circunstâncias não são aquelas que acompanham uma dispensação de graça e misericórdia; mas eram próprias de uma dispensação de verdade e justiça: e a lei não era mais que isso.

Na lei Deus declara o que o homem deveria ser, e pronuncia a maldição sobre ele se o não for. Ora quando o homem se examine à luz da lei descobre que é precisamente aquilo que a lei condena. Como poderá ele, portanto, obter a vida por meio da lei? A lei propõe a vida e a justiça como os fins a alcançar, guardando-a; mas mostra-nos, desde o primeiro momento, que nos encontramos num estado de morte e iniquidade. Precisamos desde o primeiro momento das mesmíssimas coisas que a lei propõe alcançar-nos no fim. Como vamos nós, portanto, obtê-las? Para cumprir aquilo que a lei requer é preciso que eu tenha vida; e para ser o que a lei exige devo possuir a justiça; e se eu não tiver vida e justiça sou "maldito". Porém, o fato é que eu não tenho uma nem a outra. Que devo então fazer? Eis a questão. Que respondam aqueles que querem ser "doutores da lei" (1 Timóteo 1:7): que dêem uma resposta própria para uma consciência reta, curvada sob o sentido duplo da espiritualidade e inflexibilidade da lei e a sua carnalidade desesperada.

C. H. Mackintosh

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