sábado, 25 de abril de 2020

O Mel

(Comentário Levítico 2 A OFERTA DE MANJARES: CRISTO NA SUA HUMANIDADE)

Porém, havia outro ingrediente tão claramente excluído da oferta de manjares quanto o "fermento", e este era o "mel". "Porque de nenhum fermento, nem de mel algum oferecereis oferta queimada ao Senhor" (versículo 11). Portanto, assim como o "fermento" é a expressão daquilo que é positiva e manifestamente mau na natureza, podemos considerar o "mel" como o símbolo expressivo do que é aparentemente doce e atrativo. Ambos são proibidos por Deus — ambos eram cuidadosamente excluídos da oferta de manjares —, ambos impróprios para o altar. Os homens podem aventurar-se, como Saul, a distinguir entre o que é "vil e desprezível" (1 Samuel 15:9) e o que não é: porém o juízo de Deus conta o polido Agague com o mais vil dos filhos de Amaleque. Não há dúvida de que existem boas qualidades morais no homem que devem ser consideradas pelo seu valor. "Achaste mel? come só o que te basta" (Provérbios 25:16). Mas recorde-se que isso não era admitido na oferta de manjares nem no seu Antítipo. Havia a plenitude do Espírito Santo; havia o fragrante odor do incenso; havia a virtude preservativa do "sal do concerto". Todas estas coisas acompanhavam a "flor de farinha" na Pessoa da verdadeira "oferta de manjares"; mas nenhum mel.

Que lição se encontra aqui para os nossos corações! Sim, que volume de sã instrução! O bendito Senhor Jesus sabia como dar à natureza e às suas relações o lugar próprio. Sabia a quantidade de "mel" que era conveniente; podia dizer a Sua mãe: "Não sabeis que me convém tratar dos negócios de meu Pai?" E, todavia, podia dizer também ao discípulo amado: "Eis aí tua mãe". Em outras palavras, nunca permitiu que as pretensões da natureza interferissem com a apresentação a Deus de todas as energias da perfeita humanidade de Cristo. Maria e outros também poderiam ter pensado que as suas relações humanas com o bendito Senhor lhes dava algum direito ou influência peculiar com base em motivos puramente naturais. "Chegaram, então, seus irmãos e sua mãe; e, estando de fora, mandaram-no chamar. E a multidão estava assentada ao redor dele, e disseram-lhe: Eis que tua mãe e teus irmãos (segundo a carne) te procuram e estão lá fora" (Marcos 3:31-32). Qual foi a resposta d'Aquele que a oferta de manjares simbolizava em Sua perfeição? Abandonou Ele imediatamente a Sua missão a fim de atender ao chamado da natureza? De modo nenhum. Se o tivesse feito, teria sido a mesma coisa que misturar "mel" com a oferta de manjares, o que não podia ser permitido. O mel foi fielmente excluído nesta ocasião, assim como em todas as ocasiões em que os direitos de Deus deviam ser atendidos, e, em seu lugar, o poder do Espírito, o odor do "incenso" e as virtudes do "sal" foram abençoadamente exibidos. "E ele lhes respondeu, dizendo: Quem é minha mãe e meus irmãos? E, olhando em redor para os que estavam assentados junto dele disse: Eis aqui minha mãe e meus irmãos. Porquanto qualquer que fizer a vontade de Deus, esse é meu irmão, e minha irmã, e minha mãe"* (Marcos 3:33-35).

{* Quão importante é vermos nesta magnífica passagem que fazer a vontade de Deus põe a alma num parentesco com Cristo do qual os Seus irmãos segundo a carne nada sabiam, pois isso não se baseia em laços naturais. Era tão verdadeiro a respeito daqueles irmãos como a respeito de outra qualquer pessoa, que "aquele que não nascer de novo não pode ver o reino de Deus". Maria não podia ter sido salva pelo simples fato de ser a mãe de Jesus. Ela precisou ter fé pessoal em Cristo como qualquer outro membro da família decaída de Adão. Precisou passar, por meio do novo nascimento, da velha criação para a nova. Foi por ter entesourado as palavras de Cristo em seu coração que esta bem-aventurada mulher foi salva. Não há dúvida que ela foi especialmente agraciada por ter sido escolhida como um vaso para tão santa missão, mas, como qualquer pecador, ela precisava de "alegrar-se em Deus, seu Salvador". Ela permanece no mesmo plano, está lavada no mesmo sangue, vestida com as mesmas vestes de justiça e entoará o mesmo cântico como todos os remidos de Deus.

Este simples fato dará força adicional e clareza a um ponto que foi já frisado, a saber: que a encarnação não significou Cristo tomar a nossa natureza em união consigo. Esta verdade deve ser escrupulosamente ponderada. É inteiramente apresentada em 2 Coríntios 5: "Porque o amor de Cristo nos constrange, julgando nós assim: que, se um morreu, logo, todos morreram. E ele morreu por todos, para que os que vivem não vivam mais para si, mas para aquele que por eles morreu e ressuscitou. Assim que, daqui por diante, a ninguém conhecemos segundo a carne, e, ainda que também tenhamos conhecido Cristo segundo a carne, contudo, agora; já não o conhecemos desse modo. Assim que, se alguém está em Cristo, nova criatura é: as coisas velhas já passaram, eis que tudo se fez novo" (versículos 14-17). }

Há poucas coisas que o servo de Cristo encontra serem mais difíceis do que harmonizar, com precisão espiritual, as pretensões das relações naturais, de forma a não as deixar interferir com os direitos do Mestre. No caso do nosso bendito Senhor, como bem sabemos, este ajustamento era divino. No nosso caso, acontece frequentemente que os deveres divinamente reconhecidos são abertamente negligenciados para dar lugar àquilo que imaginamos ser o serviço de Cristo. A doutrina de Deus é constantemente sacrificada a uma obra aparente do evangelho. Porquanto é bom lembrar que a verdadeira dedicação parte sempre de um ponto em volta do qual estão inteiramente asseguradas todas as reivindicações de Deus. Se estou em uma emprego que requer os meus serviços desde as dez às dezesseis horas todos os dias, não tenho o direito de sair para fazer visitas ou pregar durante aquelas horas. Se estou estabelecido em um negócio, sou forçado a manter a integridade desse negócio de uma maneira cristã. Não tenho o direito de correr para lá e para cá para pregar, enquanto o meu negócio fica abandonado e em desordem, trazendo vergonha sobre a santa doutrina de Deus. Um homem pode dizer: "Eu sinto-me chamado para pregar o evangelho e acho que o meu emprego ou negócio é um embaraço". Bem, se você for divinamente chamado e apto para a obra do evangelho e não pode conciliar as duas coisas, então renuncie ao seu emprego ou liquide o seu negócio de uma maneira cristã e parta em nome do Senhor. Mas, claro, enquanto eu continuar no meu emprego ou mantiver o meu negócio, o meu trabalho no evangelho deve partir de um ponto no qual os meus deveres nessa ocupação ou nesse negócio sejam inteiramente cumpridos. Isto é consagração. Tudo o mais é confusão, por mais bem intencionado que seja. Bendito seja Deus, temos um exemplo perfeito perante nós na vida do Senhor Jesus e ampla direção para o novo homem, na Palavra de Deus; de forma que não há razão para cometermos erros nas diversas responsabilidades para as quais formos chamados, na providência de Deus, a desempenhar, ou quanto aos vários deveres que o governo moral de Deus tem estabelecido em relação com tais responsabilidades.

C. H. Mackintosh

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