quinta-feira, 27 de fevereiro de 2020

O Monte Horebe e o Evangelho

(Comentário Êxodo 34 - O MONTE HOREBE E O EVANGELHO)

No capítulo 34, Deus dá as segundas tábuas da lei, não para serem quebradas, mas para serem guardadas na arca, sobre a qual, como já observamos, Jeová tomaria o Seu lugar como Senhor de toda a terra no governo moral. "Então, ele lavrou duas tábuas de pedra, como as primeiras; e levantou-se Moisés pela manhã de madrugada, e subiu ao monte Sinai, como o Senhor lhe tinha ordenado; e tomou as duas tábuas de pedra na sua mão. E o Senhor desceu numa nuvem e se pôs junto a ele; e ele apregoou o nome do Senhor. Passando, pois, o Senhor perante a sua face, clamou: Jeová, o Senhor, Deus misericordioso e piedoso, tardio em iras e grande em beneficência e verdade; que guarda a beneficência em milhares; que perdoa a iniquidade, e a transgressão, e o pecado; que ao culpado não tem por inocente; que visita a iniquidade dos pais sobre os filhos e sobre os filhos até à terceira e quarta geração" (versículos 4 a 7). Lembremo-nos que Deus é visto aqui no Seu governo moral do mundo e não como é visto na cruz — não como brilha na face de Jesus Cristo —, não como é proclamado no evangelho da Sua graça. Eis uma exibição de Deus no evangelho: "E tudo isso provém de Deus, que nos reconciliou consigo mesmo, por Jesus Cristo, e nos deu o ministério da reconciliação, isto é, Deus estava em Cristo reconciliando consigo o mundo, NÃO LHES IMPUTANDO os seus pecados e pôs em nós a palavra da reconciliação" (2 Coríntios 5:18-19). Não ter "ao culpado por inocente" e não "imputar o pecado" são termos que nos apresentam duas ideias de Deus totalmente diferentes. Visitar "a iniquidade" e tirá-la certamente não é a mesma coisa. A primeira é Deus agindo em Seu governo; a segunda é Deus no evangelho. Em 2 Coríntios 3, o apóstolo põe em contraste o "ministério" mencionado em Êxodo 34 com "o ministério" do evangelho. O leitor fará bem em estudar esse capítulo com atenção. Aprenderá com essa lição que todo aquele que considera o ponto de vista do caráter de Deus dado a Moisés, no Monte Horebe, como explicando o evangelho, deve ter realmente uma compreensão muito imperfeita do que é o evangelho. Não é possível descobrir os segredos profundos do coração do Pai nem na criação, nem mesmo no governo moral. Poderia o filho pródigo ter achado o seu lugar nos braços d'Aquele que Se revelou no Monte Sinai? Poderia João ter inclinado sua cabeça no coração d'Ele? Seguramente que não. Porém, Deus revelou-Se na face de Jesus Cristo; Ele nos revelou, com harmonia divina, todos os Seus atributos na obra da cruz. Foi ali que "a misericórdia e a verdade se encontraram, a justiça e a paz se beijaram" (Sl 85:10). O pecado é completamente tirado e o pecador que crê perfeitamente é justificado "PELO SANGUE DA CRUZ". Quando vemos Deus assim revelado, temos apenas, à semelhança de Moisés, de inclinar a cabeça à terra e adorar — atitude que convém a um pecador perdoado e recebido na presença de Deus!

C. H. Mackintosh

sexta-feira, 21 de fevereiro de 2020

O Senhor Diz: Irá a Minha Presença...

(Comentário Êxodo 33 - MEDIAÇÃO E RESTAURAÇÃO)

"E disse Moisés ao Senhor: Eis que tu me dizes: Faze subir a este povo, porém não me fazes saber a quem hás de enviar comigo; e tu disseste: Conheço-te por teu nome; também achaste graça aos meus olhos". Moisés solicita a companhia do Senhor como prova de o povo haver achado graça aos Seus olhos. Se fosse apenas uma questão de justiça, o Senhor só podia consumir o povo, estando no seu meio, porque era um "povo obstinado". Porém, fala de graça em relação com o Mediador e a própria obstinação do povo torna-se um argumento para pedir a Sua presença: "Senhor, se agora tenho achado graça aos teus olhos, vá agora o Senhor no meio de nós, porque este povo é obstinado; porém, perdoa a nossa iniquidade e o nosso pecado, e toma-nos pela tua herança" (capítulo 34:9). Eis uma oração não apenas bela mas tocante. O "povo obstinado" pedia a graça ilimitada e a paciência inexaurível de Deus. Só Ele podia suportá-lo.

"Disse, pois: Irá a minha presença contigo para te fazer descansar". Parte preciosa! Bendita esperança! A presença de Deus conosco durante a travessia do deserto e no fim descanso eterno! Graça para suprir as nossas necessidades presentes e a glória como a nossa sorte vindoura! Os nossos corações satisfeitos podem bem exclamar: "É bastante, meu precioso Senhor!"

C. H. Mackintosh

terça-feira, 18 de fevereiro de 2020

A Tenda da Congregação

(Comentário Êxodo 33 - MEDIAÇÃO E RESTAURAÇÃO)

O Senhor recusa acompanhar o seu povo à terra prometida: "...eu não subirei no meio de ti, porquanto és povo obstinado, para que não te consuma eu no caminho" (versículo 3). No princípio deste livro, quando o povo estava na fornalha do Egito, o Senhor pôde dizer: "Tenho visto atentamente a aflição do meu povo, que está no Egito, e tenho ouvido o seu clamor por causa dos seus exatores, porque conheci as suas dores". Porém, agora tem que dizer: "Tenho visto a este povo, e eis que é povo obstinado". Um povo afligido é objeto da graça, mas um povo obstinado é necessário que seja humilhado. O clamor de Israel oprimido havia obtido resposta por meio da manifestação da graça; mas o cântico idólatra de Israel deve ser atendido pela voz de severa repreensão.

"Povo obstinado és; se um momento subir no meio de ti, te consumirei; porém agora tira de ti os teus atavios, para que eu saiba o que te hei de fazer" (versículo 5). É só quando somos despojados dos atavios (ornamentos) da nossa natureza que Deus pode tratar conosco. Um pecador despido pode ser revestido; porém um pecador coberto de ornamentos deve ser despido. É necessário que sejamos despojados de tudo que pertence ao ego antes de podermos ser revestidos daquilo que pertence a Deus.

"Então, os filhos de Israel se despojaram dos seus atavios, ao pé do monte Horebe". Ali estavam, ao pé desse memorável monte; a sua festa e os seus cânticos haviam sido trocados por amargas lamentações, os seus atavios postos de parte, as tábuas da lei em pedaços. Tal era a sua condição, e assim Moisés se dispôs a agir imediatamente de acordo com isso. Agora já não podia reconhecer o povo no seu caráter corporativo de povo de Deus. A assembleia havia se contaminado inteiramente levantando um ídolo de sua própria fabricação no lugar de Deus — um bezerro em lugar do Senhor. "E tomou Moisés a tenda, e a estendeu para si fora do arraial, desviada longe do arraial, e chamou-lhe a tenda da congregação." Assim o arraial (acampamento israelita) foi rejeitado como o lugar da presença divina. Deus já não estava ali, nem poderia estar, pois havia sido deposto por uma invenção humana. Um novo centro de reunião foi, pois, estabelecido. "E aconteceu que todo aquele que buscava o Senhor, saiu à tenda da congregação que estava fora do arraial".

Eis aqui um princípio precioso da verdade que a mente espiritual facilmente compreenderá. O lugar que Cristo ocupa agora é "fora do arraial" (Hebreus 13:13), e nós somos convidados a ir ao Seu encontro, "fora do arraial". É necessária muita submissão à Palavra de Deus para se poder saber exatamente o que significa realmente o arraial, e muito poder espiritual para se poder sair dele; e muito mais ainda para se poder, quando se está "longe", atuar a favor dos que estão dentro do arraial no poder combinado da santidade e da graça — a santidade que nos separa da contaminação do arraial e a graça que nos habilita a atuar a favor daqueles que estão dentro dele.

"E falava o Senhor a Moisés face a face, como qualquer fala com o seu amigo; depois, tornava ao arraial, mas o moço Josué, filho de Num, seu servidor, nunca se apartava do meio da tenda". Moisés manifesta maior energia espiritual que o seu servo Josué. É muito mais fácil tomar uma posição de separação do arraial do que proceder acertadamente para com aqueles que estão dentro dele.
 
C. H. Mackintosh

sexta-feira, 14 de fevereiro de 2020

Cristo, nosso Mediador

(Comentário Êxodo 32 - APOSTASIA)

O Senhor havia dito a Moisés: "O teu povo, que fizeste subir", porém Moisés responde ao Senhor, "o teu povo, que tu tiraste...". Era o povo do Senhor, apesar de tudo; e o Seu nome, a Sua glória, e o Seu juramento estavam ligados com o seu destino. Logo que o Senhor Se liga com um povo, o Seu caráter é emprenhado e a fé esperará sempre n'Ele sobre este sólido fundamento. Moisés esquece-se completamente de si. A sua alma está inteiramente ocupada com pensamentos acerca da glória do Senhor e do Seu povo. Que servo abençoado! Como há tão poucos como ele! E quando o contemplamos nessa cena, percebemos que está infinitamente abaixo do bendito Mestre. A diferença entre eles é infinita! Moisés desceu do monte. "E vendo o bezerro e as danças, acendeu-se o furor de Moisés e arremessou as tábuas das suas mãos e quebrou-as ao pé do monte" (versículo 19). O concerto foi violado e os seu memorial foi feito em pedaços; e, então, havendo, em justa indignação, executado o juízo, "disse ao povo: Vós pecastes grande pecado; agora, porém, subirei ao Senhor; porventura, farei propiciação por vosso pecado".

Quão diferente é tudo isto do que vemos em Cristo! Veio do seio do Pai não com as tábuas da lei em Suas mãos, mas com a lei em Seu coração: não veio para conhecer a condição do povo, mas com perfeito conhecimento do que essa condição era. Demais, em vez de destruir os acordos do concerto e executar o juízo, engrandeceu a lei e honrou-a e levou sobre a Sua adorável Pessoa, na cruz, o juízo do Seu povo; e, havendo cumprido tudo, voltou para o céu, não com um "porventura farei propiciação por vossos pecados", mas para depositar sobre o trono da Majestade nas alturas os acordos imperecíveis de uma expiação realizada. Isto constitui uma diferença imensa e verdadeiramente gloriosa. Graças a Deus, não temos necessidade de seguir com ansiedade o nosso Mediador para saber se cumprirá a nossa redenção e se apaziguará a justiça ofendida. Não, Ele já fez tudo. A Sua presença nas alturas declara que toda a obra foi consumada. Nos limites deste mundo, prestes a partir, e com toda a calma de um vencedor consciente da vitória — embora tivesse ainda que atravessar a cena mais sombria —, pôde dizer: "Eu glorifiquei-te na terra, tendo consumado a obra que me deste a fazer" (João 17:4). Bendito Salvador! Bem podemos adorar-Te e exaltar-Te no lugar de glória e honra com que a justiça eterna Te coroou. O lugar mais elevado no céu pertence-Te, e os Teus santos esperam apenas o tempo em que "ao nome de Jesus se dobre todo o joelho... e toda a língua confesse que Jesus Cristo é o Senhor, para glória de Deus Pai" (Filipenses 2:10-11).

No fim deste capítulo o Senhor proclama os Seus direitos no governo moral nas seguintes palavras: "Aquele que pecar contra mim, a este riscarei eu do meu livro. Vai, pois, agora, conduze este povo para onde te tenho dito; eis que o meu anjo irá adiante de ti; porém, no dia da minha visitação, visitarei, neles, o seu pecado". Eis aqui Deus no governo, não Deus no evangelho. Aqui Deus fala de riscar o pecador; no evangelho vê-Se tirando o pecado. A diferença é grande! O povo deve ser conduzido, por intermédio de Moisés, pela mão de um anjo. Este estado de coisas era bem diferente daquele que havia existido desde o Egito ao Sinai. Israel perdera todo o direito baseado na lei, e por isso só restava a Deus retroceder à Sua soberania e dizer: "...terei misericórdia de quem eu tiver misericórdia."

C. H. Mackintosh

quarta-feira, 12 de fevereiro de 2020

O Bezerro de Fundição, a Ira do Senhor e a Intercessão de Moisés

(Comentário Êxodo 32 - APOSTASIA)

Quanto a Israel, neste capítulo, a rejeição de Deus da parte deles foi a mais completa que se poderia imaginar. "E Arão lhes disse: Arrancai os pendentes de ouro, que estão nas orelhas de vossas mulheres, e de vossos filhos, e de vossas filhas e trazei-mos... e ele os tomou das suas mãos, e formou o ouro comum buril, e fez dele um bezerro de fundição. Então, disseram: Estes são teus deuses, ó lsrael, que te tiraram da terra do Egito. E Arão, vendo isto, edificou um altar diante dele; e Arão apregoou, e disse: Amanhã será festa ao Senhor" (versículos 2 a 5). Isto era pôr Deus de parte e substituí-Lo por um bezerro. Quando puderam proclamar que um bezerro os tinha tirado do Egito, abandonaram, evidentemente, toda a ideia da presença e do caráter do verdadeiro Deus. "Depressa" se desviaram do caminho que Deus lhes tinha ordenado, para cometerem um erro tão grosseiro e espantoso! E Arão, o irmão e companheiro de Moisés no seu cargo, conduziu-os neste extravio; e pôde dizer diante de um bezerro: "Amanhã será festa ao Senhor"! Como isto é triste! Quão humilhante! Deus destituído por um ídolo! Um objeto "esculpido por artifício e imaginação dos homens" foi posto em lugar do "Senhor de toda a terra"!

Tudo isto implicava renúncia deliberada, da parte de Israel, à sua relação com o Senhor. Haviam abandonado o Senhor; e, por consequência, vemos que Ele os considerou no terreno que escolheram. "Então, disse o Senhor a Moisés: Vai, desce; porque o teu povo, que fizeste subir do Egito, se tem corrompido. E depressa se tem desviado do caminho que eu lhes tinha ordenado... Tenho visto a este povo, e eis que é povo obstinado. Agora, pois, deixa-me, que o meu furor se acenda contra eles, e os consuma: e eu farei de ti uma grande nação" (versículos 7 a 10). Aqui estava uma porta aberta para Moisés; e aqui ele manifesta uma virtude incomum e semelhança de espírito com aquele Profeta, semelhante a si, que o Senhor levantaria mais tarde. Moisés recusa ser ou ter qualquer coisa sem o povo. Argumenta com Deus, fundamentando-se na Sua própria glória, e repõe o povo sobre Ele com estas palavras tocantes: "Ó Senhor, porque se acende o teu furor contra o teu povo, que tu tiraste da terra do Egito com grande força e com forte mão? Por que hão de falar os egípcios, dizendo: Para mal os tirou, para matá-los nos montes e para destruí-los da face da terra. Torna-te da ira do teu furor, e arrepende-te deste mal contra este povo. Lembra-te de Abraão, de Isaque, e de Israel, teus servos, aos quais por ti mesmo tens jurado, e lhes disseste: Multiplicarei a vossa semente como as estrelas do céus e darei à vossa semente toda esta terra, de que tenho dito, para que a possuam por herança eternamente" (versículos 11 a 13). Essa foi uma defesa poderosa. A glória de Deus, a justificação do Seu santo nome, o cumprimento do Seu juramento: tais são os argumentos em que Moisés se firma para rogar ao Senhor para que aplacasse a Sua ira. Não podia achar na conduta ou caráter de Israel argumento de defesa; mas achou-o no Próprio Deus.

C. H. Mackintosh

terça-feira, 11 de fevereiro de 2020

As Realidades da Fé

(Comentário Êxodo 32 - APOSTASIA)

Nós somos chamados a viver pela fé; nada podemos ver pela vista dos sentidos. Jesus subiu às alturas e é-nos dito para esperarmos pacientemente pelo Seu aparecimento. A Palavra de Deus, aplicada ao coração na energia do Espírito Santo, é o fundamento da confiança em todas as coisas, temporais e espirituais, presentes e futuras. Deus fala-nos do sacrifício completo por Cristo; nós cremos pela graça e pomos as nossas almas sob a eficácia desse sacrifício, e sabemos que nunca seremos confundidos. Ele fala-nos de um sumo sacerdote, que penetrou nos céus, Jesus, o Filho de Deus, cuja intercessão é toda poderosa; nós, pela graça, cremos e apoiamo-nos confiadamente sobre o Seu poder e sabemos que seremos salvos completamente. Fala-nos da Cabeça viva com Quem estamos unidos no poder do Espírito Santo, e de Quem nenhuma influência angélica, humana ou diabólica nos poderá separar e, pela graça, cremos e nos apegamos a essa Cabeça bendita, com fé simples, e sabemos que nunca havemos de perecer. Fala-nos do aparecimento glorioso do Filho, vindo dos céus; nós, pela graça, cremos e procuramos experimentar o poder purificador e elevado desta "esperança bendita" (Tito 2:13); e sabemos que não seremos desapontados. Fala-nos de "uma herança incorruptível, incontaminável, e que não se pode murchar, guardada nos céus para nós, e que estamos guardados na virtude de Deus" (1 Pedro 1:4-5); de posse da qual herança entraremos a seu devido tempo; e, pela graça, cremos e sabemos que não seremos confundidos. Diz-nos que os cabelos da nossa cabeça estão todos contados e que nada nos faltará; e mediante a graça cremos e gozamos uma doce tranquilidade de coração.

E assim é, ou, pelo menos, assim quisera Deus que fosse. Porém o inimigo está sempre ativo, buscando fazer com que essas realidades divinas sejam desprezadas por nós — procura induzir-nos a pegar no "buril" da incredulidade e fazermos os nossos próprios deuses. Vigiemos contra ele; oremos para sermos guardados dele; testifiquemos contra ele; atuemos contra ele; e desta forma ele será confundido, Deus será glorificado e nós próprios seremos abundantemente abençoados.

C. H. Mackintosh

sábado, 8 de fevereiro de 2020

"Faze-nos Deuses"

(Comentário Êxodo 32 - APOSTASIA)

Vamos agora contemplar algo muito diferente daquilo que tem até aqui ocupado a nossa atenção. "As figuras das coisas que estão no céu" (Hebreus 9:23) passaram perante os nossos olhos — Cristo em Sua gloriosa Pessoa, em Seus deveres de misericórdia e em Sua obra perfeita, tal como são representados no tabernáculo e nos seus utensílios místicos. Havemos estado em espírito no monte e ouvido as próprias palavras de Deus, as doces declarações dos pensamentos, afeições e propósitos celestiais, dos quais Jesus é "o Alfa e o Ômega, o princípio e o fim, o primeiro e o último".

Mas agora somos convidados a descer outra vez à terra para contemplar a ruína que o homem faz de tudo em que põe a sua mão.

"Mas, vendo o povo que Moisés tardava em descer do monte, ajuntou-se o povo a Arão, e disseram-lhe: Levanta-te, faze-nos deuses que vão adiante de nós; porque enquanto a este Moisés, a este homem que nos tirou da terra do Egito, não sabemos o que lhe sucedeu" (versículo 1). Que degradação se manifesta aqui! Faze-nos deuses! Estavam abandonando Jeová para se porem debaixo da tutela de deuses feitos por mãos de homens. Nuvens escuras e névoas espessas cobriam o monte; eles estavam fartos de esperar por aquele que se havia ausentado e de se apoiarem num braço invisível, embora real. Imaginaram que um deus feito com "um buril" valia mais que o Senhor; preferiam um bezerro que podiam ver em vez do Deus invisível, mas presente em toda a parte — preferiram uma falsificação visível à uma realidade invisível! 

Desgraçadamente sempre assim tem sucedido na história do homem. O coração humano deseja alguma coisa que se possa ver— aquilo que responda e satisfaça os sentidos. Só a fé pode ficar firme "como vendo o invisível" (Hebreus 11:27). Assim, em todos os tempos, os homens têm tido a tendência de levantar imitações das realidades divinas e de se apoiarem nelas. Vemos assim como as falsificações da religião se têm multiplicado ante os nossos olhos. Aquelas coisas que sabemos, por meio da autoridade da Palavra de Deus, serem realidades divinas e celestiais têm sido transformadas em imitações humanas e terrenas pela Igreja professa. Cansada de se apoiar sobre um braço invisível, de confiar num sacrifício invisível, de recorrer a um sacerdote invisível, de esperar a direção de um chefe invisível, tem-se ocupado em "fazer" estas coisas; e, desta forma, através dos séculos, tem estado ocupada, de "buril" na mão, talhando e gravando uma coisa após outra, de sorte que agora já reconhecemos pouca similaridade entre o que vemos ao nosso redor e o que lemos na Palavra, assim como entre "um bezerro de fundição" e o Deus de Israel.

"Faze-nos deuses"! Que pensamento! O homem convidado a fazer deuses e o povo disposto a pôr a sua confiança neles! Prezado leitor, olhemos no íntimo e em torno de nós e vejamos se não descobrimos algo de semelhante. Lemos a respeito da história de Israel que todas estas coisas lhes sobrevieram como figuras, "e estão escritas para aviso nosso, para quem já são chegados os fins dos séculos" (1 Co 10:11). Procuremos, pois, aproveitar esse "aviso". Lembremo-nos de que, embora possamos não formar e nos curvar diante de "um bezerro de fundição", o pecado de Israel é um "tipo" (figura) de algo em que corremos o risco de cair. Sempre que, em nosso coração, deixamos de nos apoiar exclusivamente em Deus, quer seja no que se refere ao assunto da salvação, quer no tocante às necessidades da nossa vida, estamos dizendo, em princípio, "faze-nos deuses". É desnecessário dizer que, em nós mesmos, não somos de nenhuma maneira melhores que Arão ou os filhos de Israel; e se eles honraram um bezerro em lugar do Senhor, nós corremos o risco de atuar segundo o mesmo princípio e de manifestar o mesmo espírito. A nossa única salvaguarda é passarmos muito tempo na presença de Deus. Moisés sabia que "o bezerro de fundição" não era Jeová, e portanto não o reconheceu. Porém, quando nos afastamos da presença divina é impossível prever os erros crassos em que podemos cair e todo o mal em que podemos ser arrastados.

C. H. Mackintosh

quarta-feira, 5 de fevereiro de 2020

O Sábado e o Dia do Senhor

(Comentário Êxodo 31 - O SERVIÇO)

Este capítulo termina com uma alusão à instituição do sábado. No capítulo 16 fez-se referência ao sábado em relação com o maná; foi expressamente ordenado no capítulo 20, quando o povo foi formalmente posto sob a lei; e aqui encontramo-lo outra vez em relação com o estabelecimento do tabernáculo. Sempre que a nação de Israel é apresentada em qualquer posição especial ou reconhecida como povo colocado sob uma responsabilidade especial, então o sábado é introduzido. Consideremos atentamente o dia e o modo em que o sábado devia ser observado, assim como o fim com que foi instituído em Israel. "Portanto, guardareis o sábado, porque santo é para vós; aquele que o profanar certamente morrerá; porque qualquer que nele fizer alguma (qualquer) obra, aquela alma será extirpada do meio do seu povo. Seis dias se fará obra, porém o sétimo dia é o sábado do descanso, santo ao Senhor; qualquer que no dia do sábado fizer obra, certamente morrerá". Isto é claro e categórico, quanto o pode ser qualquer coisa, e estabelece "o sétimo dia" e nenhum outro; proíbe positivamente, sob pena de morte, toda a espécie de trabalho nesse dia. É impossível evitar o sentido claro destas palavras. E recorde-se que não existe sequer uma linha da Escritura Sagrada que prove que o sábado foi alterado ou que os princípios estritos da sua observância hajam sido relaxados (moderados), nem sequer por um mínimo grau. Se existe alguma prova nas Escrituras do contrário, será bom que o leitor se certifique que ela existe de fato.

Mas, vejamos agora se os cristãos professos* guardam de fato o sábado no dia e segundo a maneira que Deus ordenou. Seria perder tempo em provar que não o fazem. Bom, quais são as consequências de uma simples quebra do sábado? "Aquele que o fizer certamente morrerá; será extirpado".

{* N. do T.: o que inclui os verdadeiros.}

Mas, dir-se-á, não estamos debaixo da lei, mas, sim, debaixo da graça. Bendito seja Deus por essa doce segurança! Estivéssemos nós debaixo da lei e não haveria ninguém em toda a Cristandade que não tivesse caído, desde longo tempo, sob o juízo, até mesmo somente por causa da quebra do sábado. Porém, se estamos debaixo da graça, qual é o dia que nos pertence? É seguramente o primeiro dia da semana, "o dia do Senhor". Este dia é o dia da Igreja, o dia da ressurreição de Jesus, que, havendo passado o sábado na sepultura, ressuscitou vitorioso sobre todos os poderes das trevas, conduzindo assim o Seu povo da antiga criação e de tudo quanto lhe pertence para a nova criação, da qual Ele é a Cabeça, e da qual o primeiro dia da semana é a justa expressão.

Essa distinção merece a séria atenção do leitor, e deve ser examinada com oração à luz das Escrituras. Um simples nome pode ter um grande significado e pode também não significar nada. No caso que estamos tratando existe muito mais significado na distinção entre "o sábado" e "dia do Senhor" do que muitos cristãos parecem compreender. É evidente que o primeiro dia da semana tem um lugar na Palavra de Deus que não é dado a nenhum outro dia. Nenhum outro dia é designado por este majestoso título, "o dia do Senhor". Bem sei que há pessoas que negam que em Apocalipse 1:10 se faz alusão ao primeiro dia da semana; porém, por minha parte estou completamente convencido de que a crítica sã e sã exegeses garantem, e, ainda mais, exigem, a aplicação dessa passagem não ao dia do advento de Cristo em glória, mas ao dia da Sua ressurreição de entre os mortos.

Mas, certamente, o dia do Senhor nunca é chamado de sábado. Muito longe disso, fala-se desses dois dias, repetidas vezes, na sua própria distinção. Por isso, o leitor deve evitar os dois extremos. Em primeiro lugar deverá evitar o legalismo, que com tanta frequência se acha associado com o termo "sábado"; e, em segundo lugar, deverá testificar contra toda a tentativa que tenha por fim desonrar o dia do Senhor ou rebaixá-lo ao nível de um dia ordinário. O crente está livre, da maneira mais completa, da observância de "dias e meses, e tempos e anos" (Gálatas 4:10). A sua união com Cristo ressuscitado libertou-o completamente de todas essas superstições e observâncias. Mas, por muito verdadeiro que seja tudo isto, "o primeiro dia da semana" ocupa um lugar especial no Novo Testamento. Que o cristão lhe dê esse lugar! É um doce e feliz privilégio e não um jugo penoso.

O espaço não me permite entrar em mais pormenores sobre este assunto tão interessante. Aliás, já foi tratado nas páginas precedentes deste volume. Quero terminar os meus comentários frisando um ou dois pontos particulares acerca do contraste entre "o sábado" e o "dia do Senhor".

1. O sábado era o sétimo dia: o dia do Senhor é o primeiro.

2. O sábado era um teste da condição de Israel; o dia do Senhor é a prova da aceitação da Igreja numa base inteiramente incondicional.

3. O sábado pertencia à velha criação; o dia do Senhor pertence à nova criação.

4. O sábado era um dia de descanso corporal para o judeu; o dia do Senhor é um dia de descanso espiritual para o cristão.

5. Se um judeu trabalhasse no sábado devia ser condenado à morte; se o cristão não trabalhar no dia do Senhor, dá uma fraca prova de vida. Quer dizer, se não trabalhar em proveito das almas, para a extensão da glória de Cristo e a disseminação da verdade. De fato, o cristão devoto, que possui algum dom, encontra-se geralmente mais fatigado ao fim do dia do Senhor do que em qualquer outro dia da semana; pois, como poderá ele descansar enquanto as almas perecem ao seu redor?

6. O judeu era ordenado, segundo a lei, a permanecer em sua tenda no dia de sábado; o cristão é levado, pelo espírito do evangelho, a sair para participar da assembleia pública ou para anunciar o evangelho aos pecadores perdidos. 

Que o Senhor nos conceda podermos descansar com mais naturalidade no nome do Senhor Jesus Cristo e trabalhar mais vigorosamente por Ele! Deveríamos descansar com o espírito de uma criança e trabalhar com a energia de um homem.

C. H. Mackintosh

segunda-feira, 3 de fevereiro de 2020

Bezalel e Aoliabe

(Comentário Êxodo 31 - O SERVIÇO)
 
Os primeiros versículos deste breve capítulo recordam a chamada divina e os qualificativos de "Bezalel" e"Aoliabe" para fazerem o trabalho da congregação. "Depois, falou o Senhor a Moisés, dizendo: Eis que eu tenho chamado por nome a Bezalel, o filho de Uri, filho de Hur, da tribo de Judá. E o enchi do Espírito de Deus, de sabedoria, e de entendimento, e de ciência em todo o artifício... e eis que eu tenho posto com ele a Aoliabe, o filho de Aisamaque, da tribo de Dã, e tenho dado sabedoria ao coração de todo aquele que é sábio de coração, para que façam tudo que eu tenho ordenado". Quer seja para a obra do tabernáculo, na antiguidade, ou para "a obra do ministério", agora, é necessário que aqueles que são empregados nela sejam divinamente escolhidos, divinamente chamados, divinamente qualificados e divinamente nomeados; e tudo deve ser feito segundo o mandamento de Deus. Não estava dentro das atribuições do homem selecionar, chamar, qualificar ou nomear os obreiros para a obra do tabernáculo; nem tampouco o pode fazer para a obra do ministério. Além disso, ninguém podia presumir de se nomear a si próprio para a obra do tabernáculo; nem tampouco ninguém pode agora nomear-se a si próprio para a obra do ministério. Era tudo, é e deve ser absolutamente da competência divina. Pode haver quem corra por seu próprio impulso ou quem seja enviado por colegas; mas não se esqueça que todos aqueles que correm sem serem enviados por Deus serão mais cedo ou mais tarde cobertos de vergonha e confusão. Tal é a sã doutrina que nos é sugerida pelas palavras "eu tenho chamado", "eu tenho posto", "eu tenho dado", "eu tenho ordenado". As palavras de João Batista, "o homem não pode receber coisa alguma senão lhe for dada do céu", serão sempre verdadeiras. O homem tem, pois, muito pouco em que se vangloriar, menos ainda de que invejar ao seu próximo.

Existe uma lição útil a tirar da comparação deste capítulo com o capítulo 4 de Gênesis: "Tubalcaim, mestre de toda a obra de cobre e de ferro" (versículo 22). Os descendentes de Caim eram dotados de talento profano para fazer de uma terra maldita e cheia de gemidos um lugar agradável sem a presença de Deus. "Bezalel" e "Aoliabe" pelo contrário foram dotados com perícia divina para embelezar um santuário que devia ser santificado e abençoado pela presença divina e a glória do Deus de Israel.

Gostaria de pedir ao leitor que fizesse à sua própria consciência a seguinte pergunta: Consagro eu o que quer que possuo de perícia ou energia aos interesses da igreja, que é o lugar de habitação de Deus, ou ao embelezamento de um mundo ímpio e sem Cristo? Não diga em seu coração: "não sou divinamente chamado ou dotado para a obra do ministério". Note-se que embora todos os israelitas não fossem Bezaleles ou Aoliabes todos podiam servir os interesses do santuário. Existia uma porta aberta para todos poderem comunicar. E assim é agora. Cada um tem um lugar para ocupar, um ministério a cumprir, uma responsabilidade a desempenhar; e tanto o leitor como eu estamos, neste próprio momento, promovendo os interesses da Casa de Deus — O Corpo de Cristo, a Igreja — ou cooperando nos planos ímpios de um mundo que ainda está manchado com o sangue de Cristo e o sangue de todos os santos mártires. Oh! ponderemos profundamente estas coisas, na presença d'Aquele que esquadrinha os corações, a Quem ninguém pode enganar e de Quem todos são conhecidos.

C. H. Mackintosh

sábado, 1 de fevereiro de 2020

Resumo de Êxodo 25 a 30

(Comentário Êxodo 25 a 30)

Assim, pois, chegamos, no nosso rápido estudo, ao fim de uma parte distinta do livro do Êxodo. Começamos pela "arca do concerto" até que chegamos ao "altar do cobre"; retrocedemos do altar de cobre e chegamos à "santa unção"; e oh! que jornada esta, se tão somente for feita à luz infalível do Espírito Santo, em vez da companhia vacilante da luz da imaginação humana! Que grande jornada, contanto que seja feita não por entre as sombras de uma dispensação que acabou, mas no meio das glórias e das poderosas atrações do Filho de Deus, representadas por estas coisas! Se o leitor percorrer essa jornada, verá mais do que nunca o seu afeto atraído para Cristo; terá uma maior concepção da Sua glória, da Sua beleza, da Sua excelência e do Seu poder para curar uma consciência ferida e satisfazer o coração sedento; os seus olhos estarão mais fechados para as atrações do mundo e os ouvidos não prestarão atenção às pretensões e promessas da terra. Em suma, estará pronto a pronunciar um amém mais profundo e fervente às palavras do apóstolo inspirado, quando disse: "SE ALGUÉM NÃO AMA AO SENHOR JESUS CRISTO SEJA ANÁTEMA; MARANATA" (¹). (1 Coríntios 16:22)

(¹) É interessante notar o lugar que ocupa esse anátema aterrador. Acha-se no final de uma longa epístola, no decorrer da qual o apóstolo teve de reprimir alguns pecados dos mais grosseiros e vários erros doutrinais. Quão solene e significativo é, portanto, o fato de que quando anuncia o seu anátema não o lança contra aqueles que haviam introduzido esses erros e pecados, mas sim contra todo aquele que não ama ao Senhor Jesus Cristo. Por que é isto assim? É acaso porque o Espírito de Deus faz pouco caso dos erros ou pecados? Seguramente que não; toda a epístola nos revela os Seus pensamentos quanto a esses males. A verdade é que quando o coração está cheio de amor para com o Senhor Jesus Cristo, existe uma salvaguarda positiva contra toda a espécie de falsa doutrina e má conduta. Se alguém não ama a Cristo, não se pode calcular quais as ideias que possa adotar ou o caminho que possa seguir. É por isso que esse anátema apostólico tem essa forma e esse lugar na epístola.

C. H. Mackintosh

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