terça-feira, 26 de fevereiro de 2019

Não Fazer Provisão de Maná para o Dia de Amanhã

(Comentário Êxodo 16)

Não acontecia assim [como no vaso de maná que ficava dentro da arca] quando o homem o acumulava para si. Então os sintomas de corrupção depressa se manifestavam. Não podemos fazer provisões, se compreendermos a verdade e realidade da nossa posição. É nosso privilégio apropriarmo-nos, dia a dia, da preciosidade de Cristo, como Aquele que desceu do céu para dar vida ao mundo. Porém, se alguém, esquecendo-se disto, entesoura para o dia de amanhã, isto é, se reserva verdade além das suas necessidades, em vez de a converter em proveito da renovação das suas forças, a verdade certamente corromper-se-á. Eis uma lição salutar para nós. É uma cosia muito séria aprender a verdade; porque não existe um princípio que professamos ter aprendido que não teremos que provar na prática. Deus não nos quer teóricos. Trememos muitas vezes ao ouvir como algumas pessoas, quando oram, fazem ardentes votos de consagração, temendo que, quando chegar a hora da provação, não tenham o poder espiritual necessário para executar o que os seus lábios têm pronunciado.

Existe o grande perigo do intelecto ultrapassar a consciência e os afetos do coração. É por isso que muitos parecem fazer, logo ao princípio, um rápido progresso, até um certo ponto; mas então param de repente e parece retrocederem. Como um israelita que apanhasse mais maná do que precisava para o sustento do dia. Podia parecer muito mais diligente que os outros, fazendo reserva do alimento celestial; contudo cada partícula a mais das necessidades do dia não só era inútil, mas muito pior do que inútil, visto que "criava bichos". É assim com o cristão: deve usar o que tem—deve alimentar-se de Cristo como necessidade premente e essa necessidade manifesta-se no seu serviço. O caráter e os caminhos de Deus e a preciosidade e beleza de Cristo, assim como as vivas profundidades das Escrituras são somente reveladas à fé e às necessidades presentes da alma. É na medida em que usamos o que recebemos que mais nos será dado. A vida do crente tem de ser prática; e é nisto que muitos de nós fracassamos. Acontece frequentemente que aqueles que progrediam mais depressa em teoria são os mais vagarosos nos elementos práticos e experimentais, porque se trata mais de um trabalho intelectual que do coração e da consciência. Nunca devemos esquecer que o Cristianismo não é um conjunto de opiniões, um sistema de dogmas ou um determinado número de pontos de vista. É uma realidade viva por excelência—uma coisa pessoal, prática, poderosa, anunciando-se a si própria em todas as circunstâncias e cenas da vida diária, espalhando a sua influência santa sobre o caráter e a vida do indivíduo e transmitindo as suas disposições celestiais a todas as relações a que o cristão possa ser chamado por Deus a cumprir.

Em resumo, é o resultado de se estar associado e ocupado com Cristo. Tal é o cristianismo. Pode haver ideias corretas e princípios sãos e pontos de vista claros sem se ter a menor comunhão com Jesus; porém um credo ortodoxo sem Cristo não é mais que uma coisa fria, estéril e morta.

Que o leitor cristão se certifique de que não só está salvo por Cristo como vive, também, d'Ele. De fazer d'Ele a sua porção diária, buscá-Lo "de manhã" e a "Ele só". Quando qualquer coisa despertar a sua atenção, durante o dia, deve fazer esta interrogação: "Contribuirá isto para que Cristo venha ao meu coração? Será isto um meio de aumentar o meu afeto por Ele ou de me aproximar mais da Sua Pessoal Se a resposta for negativa deve rejeitar o que quer que for imediatamente: sim, rejeitar, ainda mesmo que o objetivo que chama a sua atenção seja o mais agradável à vista e se presente com o mais respeitável aspecto. Se o seu propósito for avançar e fazer progresso na vida divina, então deve cultivar a sua familiaridade pessoal com Cristo; só então poderá reclamar do seu coração o cumprimento fiel desta lealdade. Deve fazer de Cristo o seu alimento diário. Deve juntar o maná que desce sobre o orvalho e alimentar-se dele com o apetite provocado pela companhia diligente com Deus através do deserto. Que a graça de Deus o fortifique abundantemente, por meio do Espírito Santo (1).

(1) O leitor tirará muito proveito com a meditação do capítulo 6 do Evangelho de João, em relação com o assunto do maná. Estando perto a páscoa, Jesus alimenta a multidão, e depois retira-se para um monte, para estar só. Dali vem em auxílio dos Seus, que se acham aflitos sobre as águas do lago. Depois disto revela a doutrina da Sua Pessoa e da sua Obra, e declara que dará a Sua carne pela vida do mundo e que ninguém pode ter vida se não comer a Sua carne e beber o Seu sangue. Finalmente fala de Si Mesmo como subindo para onde estava primeiro e do poder vivificador do Espírito Santo. É, na verdade rico e abundante em verdade espiritual para conforto e edificação da alma. revela a doutrina da Sua Pessoa e da sua Obra, e declara que dará a Sua carne pela vida do mundo e que ninguém pode ter vida se não comer a Sua carne e beber o Seu sangue. Finalmente fala de Si Mesmo como subindo para onde estava primeiro e do poder vivificador do Espírito Santo. É, na verdade rico e abundante em verdade espiritual para conforto e edificação da alma.

C. H. Mackintosh

domingo, 24 de fevereiro de 2019

O Vaso de Maná na Arca da Aliança

(Comentário Êxodo 16)

É bem verdade que, em espírito e pela fé, nós podemo-nos alimentar, até mesmo agora, de um Cristo ressuscitado e glorificado, elevado às alturas, em virtude da redenção efetuada, conforme era ilustrado no "trigo da terra do ano antecedente" (Josué 5). E não somente isto, sabemos que quando os remidos de Deus tiverem entrado nessas regiões de glória, descanso e imortalidade, que se acham além do Jordão, terão acabado, de fato, com o alimento do deserto; mas não terão terminado com Cristo nem com a recordação daquilo que constitui o alimento específico da sua vida no deserto.

Os israelitas nunca haviam de esquecer, no meio do leite e mel da terra de Canaã, aquilo que os havia sustentado durante os quarenta anos da sua peregrinação no deserto: "... Esta é a palavra que o Senhor tem mandado: Encherás um ômer dele e o guardarás para as vossas gerações, para que vejam o pão que vos tenho dado a comer neste deserto, quando eu vos tirei da terra do Egito... Como o Senhor tinha ordenado a Moisés, assim Aarão o pôs diante do Testemunho em guarda" (versículos 32 - 34).

Que precioso memorial da fidelidade de Deus! Não os deixou morrer de fome, como os seus corações insensatos e incrédulos haviam temido. O Senhor fez chover pão do céu, alimentou-os com "pão de poderosos", velou sobre eles com toda a ternura de uma ama, suportou-os, levou-os sobre asas de águias, e, tivessem eles continuado no próprio terreno da graça, ter-lhes-ia dado posse de todas as promessas feitas aos seus pais. O vaso de maná, portanto, contendo, com efeito, a ração diária de um homem, e posto diante do Senhor, é cheio de instrução. Não houve nele vermes nem vestígios de corrupção. Era o memorial da fidelidade do Senhor provendo as necessidades daqueles que havia remido da mão do inimigo.

C. H. Mackintosh

sábado, 23 de fevereiro de 2019

Cristo: O Alimento do Cristão

(Comentário Êxodo 16)

Verdade seja que este maná era um sustento estranho, tal como um egípcio nunca poderia compreender, apreciar ou viver dele; porém aqueles que haviam sido "batizados... na nuvem e no mar" (1 Coríntios 10:2) podiam apreciá-lo e ser nutridos por ele, se tão-somente andassem em conformidade com esse batismo. Assim é agora no caso de todo o verdadeiro crente. O homem do mundo não pode compreender como é que o crente vive. Tanto a sua vida como aquilo que o mantém estão inteiramente fora do alcance da visão humana. Cristo é a sua vida, e de Cristo ele vive. Nutre-se, pela fé, com os atrativos poderosos d'Aquele que, sendo "Deus, bendito eternamente" (Romanos 9:15), "tomou sobre si a forma de servo, fazendo-Se semelhante aos homens" (Filipenses 2). Segue-O desde o seio do Pai até à cruz e desde a cruz ao trono, e encontra n'Ele, em todas as fases da Sua carreira e em cada atitude da Sua vida, um alimento precioso para o homem novo em si. Tudo em volta, embora de fato seja o Egito, é moralmente um deserto árido e lúgubre, que nada produz para o espírito renovado; e precisamente na proporção em que o crente encontrar alguma coisa com que se nutrir, o seu homem espiritual será impedido no seu progresso. A única provisão que Deus tem feito é o maná do céu, e o verdadeiro crente deverá alimentar-se sempre dele.

É verdadeiramente lamentável ver como tantos cristãos buscam as coisas deste mundo. Isto prova claramente que estão com "tédio" do maná celestial e que o consideram como "pão vil". Servem aquilo que deveriam mortificar. As atividades da nova vida estarão sempre em relação com a subjugação "do velho homem com seus feitos" (Colossenses 3:9); e quanto mais isto for conseguido, tanto mais se desejará o nutrimento "do pão que fortalece o... coração" (Sl 104:15). Assim como acontece com o físico, em que quanto maior é o exercício maior é o apetite, assim também acontece com a graça: quanto mais exercitadas forem as nossas faculdades renovadas, tanto mais sentiremos a necessidade de nos alimentarmos diariamente de Cristo. Uma coisa é sabermos que temos vida em Cristo juntamente com pleno perdão e aceitação diante de Deus, e outra muito diferente termos habitualmente comunhão com Ele — nutrindo-nos d'Ele, pela fé e fazendo d'Ele o único alimento das nossas almas. Muitos professam ter achado perdão e paz em Jesus, mas, na realidade, alimentam-se de uma variedade de coisas que não têm relação com Ele. Alimentam os seus espíritos com a leitura dos periódicos e uma variedade de literatura frívola e insípida*. Poderão encontrar Cristo nela? Acaso é por tais meios que o Espírito Santo fala de Cristo à alma? São estas as gotas de orvalho puro sobre as quais o maná desce do céu para sustento dos remidos de Deus no Deserto? Ah! não; são produtos grosseiros sobre os quais se deleita o espírito carnal. Como poderia, pois, o verdadeiro cristão alimentar-se com tais coisas? Sabemos, mediante o ensino da Palavra de Deus, que ele tem duas naturezas: e pode perguntar-se qual das duas se alimenta com o noticiário do mundo e a literatura mundana. É a velha natureza ou a nova? Só pode haver uma resposta. Pois bem, qual das duas estamos ansiosos por alimentar? A nossa conduta dará, incontestavelmente, a verdadeira resposta a esta interrogação. Se eu desejar sinceramente crescer na vida divina, se o meu grande objetivo for o de ser semelhante e consagrado a Cristo, se suspiro sinceramente pela extensão do reino de Deus no meu coração, então, sem dúvida, buscarei continuamente essa qualidade de alimento que está destinado por Deus a promover o meu crescimento espiritual. Tudo isto é claro. Os Atos de um homem são sempre o verdadeiro indício dos seus desejos e propósitos . Por isso, se vejo um crente descurar a sua Bíblia, e, contudo, dispor de tempo — sim, parte do seu melhor tempo — para ler o jornal, não me será difícil ver qual é o verdadeiro estado da sua alma. Estou certo que não pode ser um crente espiritual: não se alimenta de Cristo, não vive para Cristo nem dá testemunho d'Ele.

{* Nota do editor: Podemos pensar que o mesmo se aplica, hoje em dia, às novas formas de entretenimento: TV, séries, jogos, filmes, redes sociais, etc. Quanto tempo será que gastamos com isso, e quanto tempo com as coisas do Senhor?}

Se um israelita deixasse de apanhar, durante a frescura da manhã, a sua porção do alimento que a graça de Deus havia preparado, em breve sentiria a falta de forças para a sua jornada. Assim é conosco. Devemos fazer de Cristo o objeto supremo na ocupação das nossas almas, de outro modo a nossa vida espiritual declinará inevitavelmente. Nem tampouco podemos alimentar as nossas almas com os sentimentos e as experiências relacionados com Cristo porque, sendo incertos, não podem representar o nosso alimento espiritual. Vivemos ontem de Cristo, temos de viver hoje de Cristo e de Cristo para sempre. Além disso de nada vale alimentarmo-nos em parte de Cristo e em parte de outras coisas. Assim como no caso da vida é somente Cristo, da mesma forma o viver deve ser Cristo somente. Assim como não podemos misturar nada com aquilo que transmite a vida, tampouco podemos misturar alguma coisa com aquilo que a mantém.

C. H. Mackintosh

quinta-feira, 21 de fevereiro de 2019

A Glória do Senhor na Nuvem

(Comentário Êxodo 16)

Que quadro admirável nos oferece Israel no deserto! Detrás de si ficava o Egito, na sua frente estava a terra de Canaã,e à sua volta a areia do deserto; enquanto que eles mesmos estavam reduzidos a esperar do céu o seu sustento diário! O deserto não produziu uma folha de erva nem deu uma gota de água para o Israel de Deus. A sua porção estava só em Deus. Nada têm aqui. A sua vida, sendo celestial, só pode ser mantida por coisas celestiais. Embora estejam no mundo, não são do mundo, porque Cristo os escolheu dele. Como povo celestial por nascimento, acham-se de caminho para a sua pátria; e são mantidos por alimento que lhes é enviado dali. A sua marcha é para diante e para cima. A glória só assim os dirige. É inteiramente inútil volver os olhos para trás na direção do Egito, porque nem um só raio de glória se pode distinguir ali; "...e eles viraram para o deserto, eis que a glória do Senhor apareceu na nuvem". O carro de fogo do Senhor estava no deserto, e todos os que desejam ter comunhão com Ele tinham de estar ali também, e, estando ali, o maná do céu seria o seu alimento, e somente esse.

C. H. Mackintosh

sábado, 9 de fevereiro de 2019

Cristo: O Pão Vivo que Desceu do Céu

(Comentário Êxodo 16)

Este é o nosso alimento nesta peregrinação — Cristo apresentado pelo ministério do Espírito Santo através das Escrituras; enquanto que, para nosso refrigério espiritual, o Espírito Santo veio, como o fruto precioso da Rocha ferida — Cristo, que foi ferido por nós. Tal é a nossa parte neste mundo.

Ora, é evidente que, a fim de podermos desfrutar uma parte como esta, os nossos corações devem estar separados de tudo neste presente século mau— de tudo aquilo que poderia despertar a nossa cobiça como aqueles que vivem na carne. Um coração mundano e carnal não encontra Cristo nas Escrituras nem poderá apreciá-Lo, se o encontrar. O maná era tão puro e mimoso que não podia suportar contato com a terra. Por isso, descia sobre o orvalho (veja-se Números 1:9) e tinha de ser recolhido antes de o sol se elevar. Cada um, portanto, devia levantar-se cedo e recolher a sua parte. O mesmo acontece com o povo de Deus agora: o maná celestial tem de ser colhido todas as manhãs. O maná de ontem não serve para hoje nem o de hoje para amanhã. Devemo-nos alimentar de Cristo cada dia que passa, com novas energias do Espírito, de contrário deixaremos de crescer. Ademais, devemos fazer de Cristo o nosso primeiro objetivo. Devemos buscá-lo "cedo", antes de "outras coisas" terem tempo de se apoderar dos nossos pobres corações. E nisto que muitos de nós, enfim, falhamos! Damos um segundo lugar a Cristo, e como consequência ficamos fracos e estéreis. O inimigo, sempre vigilante, aproveita-se da nossa indolência espiritual para nos roubar a bem-aventurança e as forças que recebemos nutrindo-nos de Cristo. A nova vida no crente só pode ser alimentada e mantida por Cristo. "Assim como o Pai, que vive, me enviou, e eu vivo pelo Pai, assim quem de mim se alimenta também viverá por mim" (João 6:57).

A graça do Senhor Jesus Cristo, como Aquele que desceu do céu, para ser o alimento do Seu povo, é inefavelmente preciosa para a alma renovada; porém, a fim de poder apreciá-Lo desta forma, devemos compreender que estamos no deserto, separados para Deus, no poder de uma redenção efetuada. Se ando com Deus através do deserto, estarei satisfeito com o alimento que Ele me dá, e este é Cristo, como Aquele que desceu do céu. "O trigo da terra" de Canaã, "do ano antecedente" (Josué 5:11) tem o seu antítipo em Cristo elevado às alturas e assentado na glória. Como tal, Ele é o próprio alimento daqueles que, pela fé, sabem que estão ressuscitados e assentados juntamente com Ele nos lugares celestiais. Porém, o maná, isto é, Cristo como Aquele que desce do céu, é o sustento para o povo de Deus, na sua vida e experiências do deserto. Como um povo estrangeiro no mundo, necessitamos de um Cristo que também aqui viveu como estrangeiro; como povo assentado nos lugares celestiais, temos um Cristo que também ali está assentado. Isto poderá explicar a diferença que existe entre o maná e o trigo da terra do ano antecedente. Não se trata da redenção, pois que esta já a temos no sangue da cruz, e ali somente; mas simplesmente da provisão que Deus fez para o Seu povo em face das variadas condições em que este se encontra, quer seja lutando no deserto ou tomando posse em espírito da herança celestial.

C. H. Mackintosh

quarta-feira, 6 de fevereiro de 2019

O Maná

(Comentário Êxodo 16)

Contudo, como Israel estava debaixo da graça, as suas necessidades são supridas de uma maneira maravilhosa, como lemos no versículo 4, deste capítulo: "Então, disse o Senhor, a Moisés: Eis que vos farei chover pão dos céus". Quando se achavam envolvidos pela nuvem fria da incredulidade, eles haviam dito: "Quem dera que nós morrêssemos por mão do Senhor, na terra do Egito, quando estávamos sentados junto às panelas de carne, quando comíamos pão até fartar!" Porém, agora Deus diz que lhes dará "pão dos céus". Abençoado contraste! Que diferença espantosa entre as panelas de carne, os alhos porros e as cebolas do Egito e este maná celestial— "o pão dos poderosos"! (Sl 78:25). Aquelas coisas pertenciam à terra, este pão era do céu.

Mas este alimento celestial era necessariamente, uma experiência da condição de Israel, como está escrito, "...para que eu veja se anda em minha lei ou não". Era preciso ter-se um coração separado das influências do Egito para se dar por satisfeito, ou apreciar "o pão dos céus". Com efeito, sabemos que o povo não se contentou com este pão, antes o desprezou, declarou-o "pão vil" e desejou carne.

Desta forma os israelitas mostraram quão pouco separados estavam os seus corações do Egito e como não estavam dispostos a andar na lei de Deus: "..em seu coração se tornaram ao Egito" (Atos 7:39).

Porém, longe de serem reconduzidos para ali, foram transportados, por fim, para além de Babilônia (Atos 7:43). Eis uma lição solene e salutar para os cristãos. Se aqueles que foram libertados deste presente século mau não andam com Deus com corações agradecidos, satisfeitos com a provisão que Ele fez para os remidos no deserto, estão em perigo de cair nos laços da influência de Babilônia. É uma reflexão muito séria, que requer gosto celestial para se poder alimentar do Pão do céu. A natureza não pode saborear um tal alimento; suspira sempre pelo Egito, e, portanto, deve ser sempre dominada. É nosso privilégio, como aqueles que foram batizados na morte de Cristo e ressuscitados "pela fé no poder de Deus" (Colossenses 2:12), alimentarmo-nos de Cristo como "o pão da vida que desceu do céu" (Jo 6:51).

C. H. Mackintosh

domingo, 3 de fevereiro de 2019

As Murmurações do Povo

(Comentário Êxodo 16: O Maná: o Pão do Céu)

"E PARTIDOS de Elim, toda a congregação dos filhos de Israel veio ao deserto de Sim, que está entre Elim e Sinai, aos quinze dias do mês segundo, depois que saíram da terra do Egito". Vemos aqui Israel numa posição notável e muito interessante. É ainda o deserto, sem dúvida, mas é um lugar de paragem muito importante e significativo, a saber, "entre Elim e Sinai". Aquele era o lugar onde haviam recentemente provado as águas refrescantes do ministério divino; este era o lugar onde eles deixaram o terreno da graça soberana e se colocaram debaixo do concerto das obras. Estes fatos tornam "o deserto de Sinai" uma parte particularmente interessante da jornada de Israel. O Seu aspecto e influência são acentuados grandemente como qualquer outro ponto em toda a sua história. Vêmo-los aqui como os objetos da mesma graça que os havia tirado da terra do Egito, e, portanto, todas as suas murmurações são imediatamente atendidas por suprimento divino. Quando Deus opera na manifestação da Sua graça não há impedimento. As bênçãos que Ele derrama correm sem interrupção. É só quando o homem se coloca debaixo da lei que perde tudo; porque então Deus tem de permitir que ele se certifique de quanto pode exigir com base nas suas próprias obras.

Quando Deus visitou e redimiu o Seu povo e os tirou da terra do Egito, não foi, certamente, com o propósito de os deixar morrer de fome e de sede no deserto. Eles deviam saber isto. Deviam ter confiado n'Ele e andado na confiança daquele amor que os havia libertado gloriosamente dos horrores da escravidão do Egito.

Deviam ter recordado que era infinitamente melhor estar com Deus no deserto do que nos fornos de tijolo com Faraó. Mas não; o coração humano acha uma coisa muito difícil dar crédito a Deus pelo seu amor puro e perfeito: tem muito mais confiança em Satanás do que em Deus. Vede, por um momento, toda a dor e sofrimento, a miséria e degradação que o homem tem sofrido por causa de ter dado ouvidos à voz de Satanás, e contudo nunca tem uma palavra de queixa quanto ao seu serviço ou desejo de se libertar das suas mãos. Não está descontente com Satanás nem cansado de o servir. Colhe repetidas vezes os frutos amargos nesses campos que Satanás tem aberto de si; e, todavia, pode ser visto repetidas vezes a semear a mesmíssima semente e a passar pelos mesmos trabalhos.

Mas como é diferente quando se trata de Deus! Quando nos dispomos a andar nos Seus caminhos, estamos prontos, à primeira aparência de dificuldades ou provações, a murmurar e a rebelarmo-nos. Na verdade, não há nada em que tanto falhamos como no desenvolvimento de um espírito confiante e agradecido. Esquecemos facilmente dez mil bênçãos na presença de uma simples privação. Os nossos pecados foram todos perdoados, "fomos aceites no amado" (Efésios 1:6) e feitos herdeiros e co-herdeiros com Cristo—esperamos a glória eterna; e além de tudo mais, o nosso caminho através do deserto está coberto de misericórdias inumeráveis; e todavia deixai que uma nuvem, apenas como palma da mão de um homem, apareça no horizonte, e as ricas misericórdias do passado são por nós prontamente esquecidas à vista desta pequena nuvem, que, afinal, pode muito bem desfazer-se em bênçãos sobre a nossa cabeça.

Este pensamento deveria humilhar-nos profundamente diante de Deus. Como somos diferentes nisto, e em tudo mais, do nosso bendito Modelo! Vede-O — o verdadeiro Israel no deserto—rodeado de feras e jejuando durante quarenta dias. Como Se conduziu Ele? Murmurou? Queixou-Se da Sua sorte? Desejou achar-Se noutras circunstâncias? Ah! não. Deus era a porção do Seu cálice e a parte da Sua herança (Sl 16). E, portanto, quando o tentador se aproximou de Lhe oferecer o necessário, glórias, distinções, e as honras desta vida, Ele recusou-os e manteve firmemente a posição de absoluta dependência de Deus e implícita obediência à Sua palavra. Só aceitaria do mesmo modo o pão e a glória das mãos de Deus.

Como foi tão diferente com Israel segundo a carne! Tão depressa sentiu o sofrimento da fome "murmurou contra Moisés e contra Arão, no deserto" (versículo 2). Parece que haviam perdido a compreensão de haverem sido libertados pela mão do Senhor, porque disseram: "... porque nos tendes tirado para este desertou" E também no capítulo 17:3, lemos: "...o povo murmurou contra Moisés, e disse: porque nos fizeste subir do Egito, para nos matares de sede, a nós, e aos nossos filhos, e ao nosso gado?" Assim, eles manifestaram em todas as ocasiões um espírito irritado e de queixume, e mostraram quão pouco realizavam a presença do seu Poderoso e infinitamente gracioso Libertador.

Ora, não há nada que tanto desonre a Deus como um espírito murmurador por parte daqueles dos que Lhe pertencem. O apóstolo apresenta como característico especial da corrupção dos gentios que, "...tendo conhecido a Deus, não o glorificaram como Deus, nem lhe deram graças" (Romanos 1:21). E então segue-se o resultado prático deste espírito ingrato, "antes em seus discursos se desvaneceram, e o seu coração insensato se obscureceu". Aquele que deixa de reter um sentido grato da bondade de Deus tornar-se-á rapidamente "entenebrecido". Assim Israel perdeu o sentido de estar nas mãos de Deus; e isto levou-os, como podia esperar-se, a trevas mais espessas, visto que os encontramos, mais tarde na sua história, dizendo: "Porque nos traz o Senhor a esta terra, para cairmos a espada e para que nossas mulheres e nossas crianças sejam por presa"? (Números 14:3). Tal é a atitude que a alma que não está em comunhão toma. Começa por perder a noção de estar nas mãos de Deus para seu bem, e, termina por se julgar nas Suas mãos para seu mal. Que triste progresso!

C. H. Mackintosh

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