sexta-feira, 1 de março de 2019

O Dia de Repouso: o Sábado

(Comentário Êxodo 16)

Existe mais um ponto neste capítulo que desejo mencionar, isto é, a instituição do sábado relacionada com o maná e a posição de Israel tal qual nos é apresentada aqui. Depois do capítulo 2 de Gênesis até ao capítulo que temos perante nós, não se faz menção desta instituição. Isto é singular. O sacrifício de Abel, a carreira de Enoc com Deus, a pregação de Noé, a chamada de Abraão, juntamente com a história pormenorizada de Isaque, Jacó e José, são todas representadas; mas não se faz alusão ao sábado até ao momento em que encontramos Israel reconhecido como um povo em relação com o Senhor, e consequentemente debaixo da responsabilidade que essa relação implica.

O sábado foi interrompido no Éden; e é aqui instituído outra vez para Israel no deserto. Mas, ah, o homem não ama o repouso (descanso) de Deus! "E aconteceu, ao sétimo dia, que alguns do povo saíram para colher, mas não o acharam. Então, disse o Senhor a Moisés: Até quando recusareis guardar os meus mandamentos e as minhas leis? Vede, visto que o Senhor vos deu o sábado, por isso ele, no sexto dia, vos dá pão para dois dias; cada um fique no seu lugar, que ninguém saia do seu lugar no sétimo dia" (versículos 27-29). Deus queria que o Seu povo gozasse de um doce repouso com Ele Mesmo: queria dar-lhes repouso, alimento, e refrigério no deserto. Porém o coração humano não está disposto a repousar com Deus. O povo podia recordar e falar dos tempos em que "estavam sentados junto às panelas de carne" no Egito; mas não podiam apreciar a bem-aventurança de se sentarem nas suas tendas, gozando com Deus "o descanso do sábado" e alimentando-se com o maná celestial.

E não se esqueça que o sábado é apresentado aqui como um caso de dádiva: "...o SENHOR vos deu o sábado" (versículo 29). Mais adiante, neste mesmo livro, encontramo-lo outra vez mencionado debaixo da forma de lei e acompanhado de maldição e juízo, no caso de desobediência; porém, quer o homem caído receba um privilégio ou uma lei, é-lhe indiferente. A sua natureza é má. Não pode descansar em Deus nem trabalhar para Deus. Se Deus trabalha e lhe faz um repouso, ele não quer guardá-lo; e se Deus o manda trabalhar, não o faz. Tal é o homem. Não tem lugar em seu coração para Deus. Pode usar o nome do sábado como um meio de se exaltar a si próprio ou como insígnia da sua própria religiosidade; mas quando volvemos os olhos para o capítulo 16 do Êxodo descobrimos que não pode celebrar o sábado de Deus como uma dádiva; e quando abrimos o capítulo 15 de Números, versículos 32 a 36, descobrimos que não pode guardá-lo como uma lei.

Ora, nós sabemos que o sábado, assim como o maná, era uma figura. Em si mesmo, era uma bênção — uma agradável mercê da parte de um Deus de amor e graça, que queria suavizar o trabalho e a labuta de um mundo pecaminoso mediante o refrigério de um dia de descanso em cada sete. Qualquer que seja a forma de encararmos a instituição do sábado, vê-la-emos sempre fecunda da mais rica graça, quer a encaremos a respeito do homem ou acerca da criação animal. E embora os cristãos guardem o primeiro dia da semana — o dia do Senhor— e liguem com ele as regras que lhe são próprias, todavia observa-se a mesma providência graciosa; nem a mente governada por sentimentos próprios procuraria, por um momento sequer, interferir com uma tal demonstração de misericórdia: "... o sábado foi feito por causa do homem" (Marcos 2:27); e embora o homem nunca o houvesse guardado, segundo o pensamento divino, isso não diminuiu a graça que resplandece na sua instituição, nem o priva da sua profunda significação como figura do repouso eterno que resta para o povo de Deus, ou sombra dessa substância a qual a fé goza agora na Pessoa e Obra de um Cristo ressuscitado.

O leitor não deve supor, portanto, que o que tem sido dito, ou possa ser acentuado, nesta linhas, tem por fim menosprezar, no mínimo, a provisão misericordiosa de um dia de repouso para o homem e para a criação animal ou interferir com o lugar distinto que o Dia do Senhor ocupa no Novo Testamento. Muito longe disso! Como homem, aprecio o primeiro destes dias, e como cristão regozijo-me no último o bastante para não escrever ou articular uma sílaba sequer em desabono quer de um quer do outro. Gostaria apenas de pedir ao leitor para pesar, com imparcialidade, na balança das Escrituras, tudo que tem sido afirmado, e não formar um juízo precipitadamente antecipado.

Este assunto será tratado outra vez, mais adiante, se o Senhor permitir. Entretanto, procuraremos aprender a apreciar melhor o valor do repouso que o nosso Deus nos preparou em Cristo, e gozar d'Ele como o nosso repouso, alimentando-nos d'Ele como "o maná escondido" (Apocalipse 2:17) e posto, no poder da ressurreição, no lugar santíssimo — o memorial do que Deus fez por nós, vindo a este mundo, em Sua graça infinita, a fim de que pudéssemos estar perante Ele, segundo as perfeições de Cristo, e nos alimentarmos com as Suas riquezas inexauríveis para sempre.

C. H. Mackintosh

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Postagens populares